Uma tendência recente na literatura entre os contistas de primeira linha fez da frase “Fui mudado pelo que vi” parte da nossa linguagem cotidiana. Com toda a beleza e tragédia em nosso mundo, não há carência de coisas para se ver. Algumas pessoas viram coisas tão lindas ou arrebatadoras que eles anunciam ao mundo que nunca mais serão os mesmos. A história está cheia de descrições daqueles que viram o inimaginável e foram mudados para sempre. Talvez a mais penetrante destas descrições sejam as daqueles que viram a Deus. Na Bíblia, existem muitas dessas descrições, porém entre as mais conhecidas está aquela do profeta Isaías.

 

Além do sagrado

No sexto capítulo de Isaías, o mesmo relata que “viu o Senhor”. Nós não devemos fazer vistas grossas para esta abertura de enunciado. Clamar ter visto a Deus não é o mesmo que clamar ver qualquer outra entidade. Ver a Deus é uma experiência especial e perigosa. Em Êxodo, quando Moisés pede para vê-lo, Deus responde que “Não poderás ver minha face, porquanto homem nenhum verá a minha face e viverá” (Êxodo 33:20. NIV). As histórias no restante da Bíblia demonstram a verdade das palavras de Deus: Cada pessoa nas Escrituras que relata ter visto a Deus, sem exceção, teme por sua vida. Não é pouca coisa estar na presença de Deus. Isaías descreve a cena no versículo 1, nada do séquito de Deus encher o templo, e sim uma referência ao tamanho relativo de Deus. (O templo era o maior prédio que Isaías já tinha visto.) Ainda, Deus é tanto superior quanto é louvado. Enquanto que nós freqüentemente pensamos naquelas palavras em relação a Deus, não consideramos quais seus significados. Certamente que não houve encobrimento da parte de Isaías ao usar tais palavras. Para ver algo e imediatamente reconhecer que aquilo é superior e louvável, diz algo importante sobre o objeto da descrição.

Isaías continua e descreve uma hoste de serafins (anjos) que estão servindo a Deus. Eles estão cobrindo suas faces e pés na presença de Deus. Esta cobertura do rosto e pés é sinal de humildade.

Enquanto isso, os serafins começam a cantar uma música que é familiar para muitos: “Santo, santo, santo é o Senhor Deus, o Todo-Poderoso, que era, e que é, e que há de vir”. Nesse momento, o templo estremece e há fumaça ao redor. A repetição da palavra “santo” na canção dos anjos serve como modificador ou multiplicador do termo sendo repetido, então, neste caso em particular, Isaías não está somente na presença de um Deus santo. Nem está na presença de um santo, santo (santo multiplicado por santo) Deus. Ele está na presença de um Deus tão santo que usar a palavra apenas duas vezes é fazer uma descrição completa e sofridamente imprecisa.

O peso esmagador da santidade

Isaías reage a essa inacreditável santidade do único jeito que pode – temendo por sua vida: “ Ai de mim! Pois estou perdido; porque sou um homem de lábios impuros, e habito no meio de um povo de impuros lábios; os meus olhos viram o rei, o SENHOR dos exércitos” (versículo 5, NIV). Nós podemos perguntar por que Isaías reagiria dessa maneira. Deus dá visões com o intuito de matar aqueles que as recebem? Isaías fez alguma coisa inapropriada para temer tanto por sua vida? É provável que a resposta correta não envolva nada mais do que a santidade de Deus. Na presença de Deus, todas as indecisões e transgressões de Isaías tornaram-se aparentes rapidamente. As próprias palavras de Isaías dão uma indicação disto quando nota que tanto ele quanto todos na sua nação são impuros. Ficar diante de Deus traz a verdade à luz: somente Deus é santo, e vê-lo é saber como a humanidade é profana.

Em resposta ao clamor de Isaías, nós podemos esperar que Deus providencie conforto a ele na forma de um tipo de palavra de encorajamento, porém existe somente silêncio vindo do trono. Aparentemente, Isaías havia julgado corretamente a situação e sua única conseqüência possível – sua destruição. Ainda que Deus não tenha deixado Isaías ser destruído. Em vez disto, ele envia um serafim recolher uma brasa do altar para tocar os lábios de Isaías – exatamente a parte do corpo que Isaías declarara como impura. Após a brasa tocar seus lábios, o serafim pronuncia que a culpa de Isaías foi tirada dele e que seu pecado havia sido expiado. A ação de limpeza de Isaías vem de Deus, não de Isaías, e agora ele tinha sido limpo, nós descobrimos o propósito para esta visão.

O chamado

Revendo a razão para a visão, Deus faz dois questionamentos: “a quem enviarei, e quem há de ir por nós”? (versículo 8a). A reação de Isaías não é surpresa, por duas razões. Primeira, Isaías havia acabado de ter uma experiência na qual Deus dera-lhe um presente bastante especial. É uma reação natural servir um Deus que poupou sua vida e o abençoou. Segunda, e talvez a razão mais direta, não há indicação no texto de que alguém (além do serafim) esteja presente para ser voluntário. Ainda, Deus concedera a Isaías a oportunidade de responder ao seu chamado, e o profeta escolheu agarrar esta oportunidade.

Depois deste chamado, Deus informa a Isaías que sua tarefa é a de servir como porta-voz de Deus até o povo estar tão familiarizado e sem reação com sua voz que o ignorariam por completo. Esta não é exatamente a mais encorajadora missão a ser dada. A pergunta que Isaías faz em resposta é também completamente inteligível: “Até quando Senhor?” E respondeu: Até que sejam desoladas as cidades e fiquem sem habitantes, e as casas sem moradores e a terra seja de todo assolada. Ainda assim, não temos indicação de que Isaías tenha se afastado de sua tarefa, e supostamente ele foi serrado ao meio pelo Rei Manassés muitos anos depois. Sua devoção à tarefa que lhe foi dada, apesar de ser uma tarefa muito desprazerosa, foi abastecida pela visão do Deus santo ao qual ele servia.

Não importa o que, nem onde

A experiência de Isaías com Deus demonstra lições importantes sobre quem Deus é e como nós devemos segui-lo. Primeira, devemos reconhecer que o primeiro ato aqui foi feito por Deus. Foi Deus quem escolheu Isaías. Segunda, devemos reconhecer que nosso Deus é santo e soberano. Disto, também precisamos reconhecer, em nós mesmos, que nunca seremos completamente capazes de fazer o que Deus exige de nós, mas o Senhor nos prepara para ir e fazer o que ele nos chamar a fazer. Essa é a missão dele, sua força e seu Reino. Tudo o que é exigido de nós é que, assim como Isaías, façamo-nos disponíveis para aquilo que Deus nos chamar a fazer. Enfim, todos devemos reconhecer que, mesmo se formos chamados para uma missão difícil ou desprazerosa, temos acesso a um Deus poderoso através do nosso Salvador, Jesus Cristo, que também opera em nós.

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