Ententendo e Vivendo
Profeta Jonas: a compaixão de Deus se estende a todos, não apenas a Israel
- Detalhes
- Pr. Arturo Daniel Pereira Posada
- Entendendo e Vivendo
E disse o SENHOR: Tiveste tu compaixão da aboboreira, na qual não trabalhaste, nem a fizeste crescer, que numa noite nasceu, e numa noite pereceu; E não hei de eu ter compaixão da grande cidade de Nínive em que estão mais de cento e vinte mil homens que não sabem discernir entre a sua mão direita e a sua mão esquerda, e também muitos animais?
Jonas 4:10-11
INTRODUÇÃO
O livro do profeta Jonas é um dos mais peculiares livros do Antigo Testamento, ao depararmo-nos com a sua leitura chama a nossa atenção notoriamente, pelo contexto da sua história: em primeira instância a negação do profeta em obedecer à ordem de Deus (Jonas 1 1-3). Segundo, a descrição que certamente causa muito ceticismo, principalmente nos dias de hoje, por parecer mais uma história tirada de um filme ficção. Também tem gerado acalorados debates de cunho teológico a respeito de Jonas ter permanecido literalmente ou não por três dias e três noites dentro do ventre do grande peixe (Jn 1:17-2:10). Em terceiro lugar, a inversão de valores claramente demonstrada por Jonas ao desejar e esperar a destruição de seus inimigos (Jonas 4:10). Quarto ponto, o desfecho final onde podemos observar com clareza o amor misericordioso de Deus estendido a todas as nações e não unicamente a Israel, ao perdoar os pecados de Nínive, capital do império Assírio, por seu arrependimento genuíno perante a pregação das Boas Novas feita pelo profeta Jonas (Jonas 3:10-4:2).
Numa análise destes quatro pontos podemos entender o grande pano de fundo do livro de Jonas, a respeito da grande responsabilidade que nos é imposta como filhos de Deus (Jo 14:20-24), de anunciarmos as Boas Novas da salvação a todos, principalmente aos nossos inimigos (Mateus 5:38-48). Porque cremos que isso seja a parte mais difícil de ser feita por um “cristão”. Assim demonstramos a nossa fé e o amor de Deus que reina em nossas vidas dirigindo os nossos passos, para que os que ainda jazem nas trevas deste mundo possam participar da maravilhosa graça que nos alcançou. De maneira que, mediante a confissão de seus pecados e arrependimento, possam ter suas vidas transformadas em Cristo (Efésios 2:1-10).
ESTRUTURA DO LIVRO
O nome Jonas (Yônãh) tem como significado “pomba”. Filho de Amitai (2 Reis 14 25, Jonas 11), ele era originário de GateHefer, região da Galileia. Jonas e a sua família provavelmente pertenciam à tribo de Zebulom (Josué 19:10-13). [] É um dos profetas menores unicamente pela pequena extensão de seu livro.
O contexto da carta de Jonas acontece aproximadamente entre 782/81-753 a.C41, durante o período da divisão dos reinos: Reino do Norte ou Israel, governada por Jeroboão II (793-753 a.C.) (2 Reis 14 23-25), e o Reino do Sul ou Judá, governada por Uzias (766-715 a.C.) (2 Reis 15:1).
Na estrutura literária, é uma obra considerada como uma narrativa histórica, podendo ter sido o profeta o seu escritor ou não, já que as opiniões dos teólogos são bem divididas. Mas, em ambas as posições, Jonas e os marinheiros (Jonas 14-16) que viveram os fatos ocorridos auxiliaram a narração e propagação da história.
O objetivo principal do livro é mostrar a inesgotável misericórdia de Deus derramada em forma de perdão, mediante Seu amor por aqueles que O buscam e se arrependem.
CONTEXTO SOCIOECONÔMICO E POLÍTICO
Podemos ver com clareza ao analisarmos o livro de 2 Reis, no capítulo 14, nos deparamos como um Israel (Reino
do Norte) extremamente pobre, a tal ponto que já não havia entre eles grandes divisões sociais (classe escrava, classe inferior, classe média e classe rica). Mas, sim, uma unificação das três primeiras em contraponto à última: “porque o Senhor viu que a aflição de Israel era muito amarga, porque não havia nem escravo, nem livre, nem quem socorresse Israel” (2 Reis 1426 NAA). Em outras palavras, quem era pobre era realmente pobre e quem era rico era realmente rico (2 Reis 15 19-20). Os que eram a minoria, dos quais podemos entender que o profeta Jonas faria parte, já que contava com suficiente dinheiro para comprar a sua passagem de barco para a cidade de Társis, a fim de fugir do seu chamado: “Jonas se levantou, mas para fugir da presença do Senhor...,” (Jonas 13 NAA).
A vida religiosa da época também não contribuía muito para melhorar a situação, já que o rei Jeroboão II tinha se
afastado da presença de Deus, fazendo tudo ao contrário à Sua vontade, continuando, assim, o legado deixado por Jeroboão I: “Jeroboão fez o que era mau aos olhos do Senhor. Jamais se afastou de nenhum dos pecados de Jeroboão, filho de Nebate, que este levou Israel a cometer” (2 Reis 1424 NAA). Piorando ainda mais a situação de calamidade daquela época.
Em contrapartida à toda situação social e econômica na qual o Reino do Norte se encontrava sob o reinado de Jeroboão II, a situação político-militar se mantinha bem alicerçada, dando grande poder militar a Israel para ganhar os confrontos contra os seus inimigos: “Quanto aos demais atos de Jeroboão, tudo o que fez, o seu poder, como lutou e como reconquistou Damasco e Hamate, pertencentes a Judá, para Israel, não está tudo escrito no Livro da História dos Reis de Israel?” (2 Reis 14 28 NAA).
Em meio a todo o panorama socioeconômico e político do Reino do Norte onde o profeta Jonas se encontrava, nós temos Nínive se levantando como a capital do império Assírio, extorquindo economicamente Israel (2 Reis 15 19-20). Isso já os revela alguns dos principais motivos pelos quais o profeta Jonas se recusou a obedecer à ordem de Deus (Jonas 12 NAA):
1. preconceito político: Nínive era um grande inimigo
político de Israel, além de extorqui-lo com altíssimas taxas a
serem pagas;
2. preconceito religioso: Israel era o povo escolhido por
Deus, o que tornava os outros povos “gentios”, indignos de
receberem perdão e misericórdia para a salvação (Êx 4:22; Dt
7: 1-9; Deuteronômio 26:16-19) e
3. preconceito cultural: Nínive era distante de Israel, falava outra língua, era um povo pagão, prostrava-se perante outros deuses, era extremamente violento nos seus confrontos militares nas invasões a outras nações. Jonas decidira não pregar para Nínive por achá-la indigna da mensagem de Deus: “porque a sua maldade subiu até a minha presença” (Jonas 12b).
Trazendo este contexto para os dias de hoje, quantas vezes nós mesmos não praticamos alguns destes preconceitos contra os nossos semelhantes? E nos calamos, deixando de pregar o arrependimento para a salvação em Cristo Jesus. Devemos nos perguntar quantas vezes orou por um inimigo, por alguém que nos fez mal (Mateus 5:38-47), ou seja diferente de nós? Quantas vezes entrou numa cela para pregar o Evangelho, ou não se afastou quando uma “senhora da noite”, um “LGBTQIA+” ou um mendigo entraram na igreja e se sentaram a seu lado? Isso sem falar de irmos levar as Boas Novas da salvação para outras nações neste nosso Brasil que tem uma diversidade tão linda e tão grande de outros povos entre nós (Mateus 28:19). Entendemos aqui dois pontos:
1. não somos tão diferentes de Jonas quanto pensamos, e mais: tem muitos “Jonas” hoje em dia sentados dentro das igrejas para fugir do chamado de Deus,
2. nosso testemunho é um grande divisor entre dois pólos opostos, o “convertido” e o “convencido” (Mateus 7:19).
Temos algum tipo de preconceito que nos atrapalha levar o Evangelho para todas as pessoas? |
O CHAMADO DE DEUS
O primeiro chamado que Deus fizera sobre a vida do profeta Jonas, é uma ordem que demonstra a indiferença e a frieza do coração do profeta: “A palavra do Senhor veio a Jonas, filho de Amitai, dizendo: — Levante-se, vá à grande cidade de Nínive e pregue contra ela, porque a sua maldade subiu até a minha presença” (Jonas 1 1-2 NAA). Motivo este que o leva para a cidade de Társis, para fugir da responsabilidade que Deus lhe dera (Jonas 1 3). Em primeira instância, porque o desejo do seu coração não se encontrava em sintonia com o desejo do coração de Deus, depois pelos próprios preconceitos que ele carregava contra o povo de Nínive pelas situações conflitantes nas quais as duas nações se encontravam.
O que nos leva a seguinte pergunta: quantas vezes nós não fugimos da mesma forma que o profeta, do chamado que Deus nos dera por motivo pessoais ou fúteis? Ou por não aceitarmos que alguém que consideramos indigno, também possa ser alcançado pela inesgotável misericórdia de Deus? Faz-se necessário trazer à nossa memória as passagens de Ezequiel 3:16-21 e Mateus 10:32-33 para entendermos a responsabilidade que todos temos de anunciar a salvação em Cristo Jesus.
Consequências pessoais: é inevitável passarmos pela história do profeta Jonas sem observarmos as consequências pelas quais o profeta estava disposto a passar, pela dureza de seu coração. Em primeiro lugar vemos claramente a mão de Deus se levantando contra ele pela sua desobediência. “Mas o Senhor lançou sobre o mar um forte vento, e levantou-se uma tempestade tão violenta, que parecia que o navio estava a ponto de se despedaçar” (Jonas 14). Em segundo lugar, vemos que ele “reconhece que está fugindo” (Jonas 110-11), e prefere a própria morte antes de “dar o braço a torcer”, quebrar o seu orgulho e voltar atrás, “Em seguida, os marinheiros pegaram Jonas e o lançaram no mar; e a fúria do mar se acalmou” (Jonas 115). Naquela situação se pedisse perdão a Deus não o perdoaria? Se pedisse uma nova chance para ir até Nínive, Deus não lhe concederia? Claro que sim.
Isso nos leva a entender que muitas vezes preferimos passar pelas consequências da desobediência a Deus, do que a quebrar nosso orgulho só porque não estamos de acordo em fazer aquilo que Deus nos ordena. Lembrando que o Senhor nos privilegia dando oportunidade de sermos usados por Ele para o cumprimento da Sua vontade.
Fugimos da vontade de Deus quando: não vivemos em comunhão, nos tornamos pedra de tropeço, fazemos acepção de pessoas, não levamos as Boas Novas, não permitimos o mundo ver Cristo através da nossa vida, mentimos, roubamos nos dízimos e nas ofertas, não participamos da Santa Ceia do Senhor.
Estendendo as nossas consequências. Na grande maioria das vezes, como não é diferente aqui na história de
Jonas, as consequências da nossa desobediência não ficam retidas a nós, mas também alcançam as pessoas que estão em nosso convívio. Quando Deus mandou a tempestade sobre Jonas, ela afetou todos os que ali estavam com ele (Jn 1:4-5), e em quanto tudo isso acontecia ele dormia “Jonas, porém, havia descido ao porão do navio; ali havia se deitado, e dormia profundamente” (Jonas 15b). Muitas vezes, agimos igual não reconhecendo nossos próprios erros e pecados, fazendo outras pessoas sofrerem por nossa própria causa.
Jonas fugiu de sua responsabilidade por dois motivos: primeiro seu coração não estava em sintonia com a vontade de Deus, segundo devido ao seu preconceito contra os habitantes de Nínive. |
INVERTENDO OS VALORES
Uma vez que Jonas se encontra no ventre do grande peixe, na solidão, à beira da morte, ele “cai em si”. Se arrepende pedindo perdão e clamando a Deus (Jonas 117-2:1-3) que lhe dá uma nova oportunidade de fazer aquilo que foi chamado desde o início, começando assim um segundo chamado (Jn 2:10-3:1-3). O profeta, uma vez em Nínive, começa anunciar nas ruas da cidade a vontade de Deus: “Ainda quarenta dias, e Nínive será destruída” (Jonas 3:4b). Pregação esta que resultou na maior conversão de um povo pagão em uma única mensagem. Cento e vinte mil pessoas foram salvas pela sua pregação pois creram mediante sua fé em Deus e se arrependeram (Jn 3:10). Mas em vez de isso ser um grande motivo de alegria no coração de Jonas, foi um motivo de grande tristeza e raiva,
a ponto de desejar sua morte novamente (Jonas 4:1-3), motivo este que nos leva a entender que por mais que Jonas tivesse pedido perdão a Deus no ventre do peixe, ele mesmo não tinha conseguido perdoar em seu coração a cidade de Nínive. Isso nos permite ver a inversão de valores do profeta. Esta inversão fica ainda mais clara quando ele dá mais importância para uma aboboreira que não plantara e secou, do que por uma cidade inteira que se converteu e foi salva pela misericórdia de Deus (Jonas 4 6-9). O profeta Jonas se encontrava numa depressão espiritual muito grande por não conseguir se livrar de seus próprios preconceitos contra a cidade de Nínive capital da Assíria, atual Iraque.
O que nos leva a refletir sobre quantas vezes alimentamos preconceitos e sentimentos de vingança pessoal contra os nossos semelhantes nos impedindo assim de demonstrarmos que o amor misericordioso de Deus possa os alcançar. Não somos capazes de perdoar porque o nosso coração não se encontra em sintonia com a vontade de Deus.
Por mais que Jonas tivesse pedido perdão a Deus no ventre do peixe, ele mesmo não tinha conseguido perdoar em seu coração a cidade de Nínive. Ele dá mais importância para uma aboboreira que não plantara e secou, do que por uma cidade inteira que se converteu e foi salva pela misericórdia de Deus. |
A MISERICÓRDIA INESGOTÁVEL DE DEUS
“Jonas começou a percorrer a cidade caminho de um dia, e pregava, dizendo: — Ainda quarenta dias, e Nínive será destruída” (Jonas 3:4). Há mensagem mais dura e assustadora a ser ouvida? A de que a cidade de Nínive teve que ouvir do profeta Jonas de que seriam destruídos por causa das suas muitas transgressões e pecados, que não lhes resta nada além de quarenta dias de vida?
É exatamente neste contexto que podemos ver um dos maiores avivamentos do Antigo Testamento. O povo de Nínive ouviu atentamente a repreensão de Deus contra eles, aceitou a correção e dobrou os joelhos no maior clamor de uma nação pagã da época, todos se uniram com um único objetivo: a busca pelo perdão divino.
“Os ninivitas creram em Deus. Proclamaram um jejum e vestiram roupa feita de pano de saco, desde o maior até o menor” (Jonas 3:5). Vemos quão impactantes foram as palavras proferidas pôr o profeta que até mesmo o rei busca a remissão das suas transgressões junto a toda sua nação, declarando em decreto real um jejum e oração tão radical que até mesmos os animais de toda Nínive e cada um dos cento e vinte mil habitantes teriam que obedecer. Eles creram na mensagem de Jonas, reconheceram seus muitos erros, clamaram fervorosamente a Deus, pediram perdão, então foram alcançados pela misericórdia de Deus e foram perdoados “Deus viu o que fizeram, como se converteram do seu mau caminho; e Deus mudou de ideia quanto ao mal que tinha dito que lhes faria e não o fez” (Jonas 3:10).
Então nas entrelinhas do capítulo 3 versículo 10 conseguimos ver o aparente “arrependimento de Deus para o qual quero me valer das palavras do nosso saudoso Pr Jonas Somer para expor o tema:
“A própria linguagem do Antigo Testamento é uma linguagem antropopática e antropomórfica, em que Deus adapta sua incompreensibilidade a frágil compreensão da criatura. A palavra hebraica para arrependimento é noham. É usada para indicar tanto o arrependimento humano quanto o arrependimento de Deus no Antigo Testamento.
Quando a Bíblia apresenta textos onde Deus se arrepende de algo e muda sua intenção para o homem, “evidentemente é só a maneira humana de falar. Na realidade a mudança não é em Deus, mas no homem e, nas relações do homem com o Senhor. Em suma, o arrependimento de Deus não ocorre por causa de qualquer mudança nele, mas por causa de nossa mudança com ele.
O povo de Nínive ouviu atentamente a repreensão de Deus contra eles, aceitou a correção e dobrou os joelhos no maior clamor de uma nação pagã da época, todos se uniram com um único objetivo: a busca pelo perdão divino. |
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nós podemos fugir das nossas responsabilidades, mas nunca conseguiremos fugir da consequência delas.
QUESTÕES PARA DISCUSSÃO EM CLASSE
1. Qual é a ordem que Deus deixou para cada um de nós?
R.
2. Quais preconceitos nos levam a fugir, hoje em dia, da Grande Comissão que Deus deixou para nós?
R.
3. Discuta qual é a relação que existe entre a história do profeta Jonas e a passagem de Romanos 12 19? E como isso se aplica a nós hoje em dia?
R.
4. Por que razão parece ser uma das partes mais difíceis da vida cristã o perdão e a pregação aos nossos inimigos?
R.
5. Explique a afirmação do profeta Jonas de que “Deus se arrependeu”.
R.