ORA, tinham jurado os homens de Israel em Mizpá, dizendo: Nenhum de nós dará sua filha por mulher aos benjamitas. Veio, pois, o povo a Betel, e ali ficou até à tarde diante de Deus; e todos levantaram a sua voz, e prantearam com grande pranto, E disseram: Ah! SENHOR Deus de Israel, por que sucedeu isto, que hoje falte uma tribo em Israel?
Juízes 21:1-3
INTRODUÇÃO
Chegamos ao fim deste momento de aproximadamente trezentos anos do povo israelita, momento trágico, caótico e indefinido. Várias passagens no livro de Juízes demonstram a fraqueza humana, a fé abalada e as consequências catastróficas para o povo de Deus. Mesmo o Senhor confirmando a Sua fidelidade a esse povo, muitos se desviaram de Sua presença, fazendo o que lhes parecia certo. É de nos surpreender neste livro a recorrência dos mesmos fatos que levavam sempre os israelitas a um jugo determinado pelo inimigo.
Ao fazerem o que era mal aos olhos do Senhor, os israelitas aparentemente não haviam aprendido com os erros do passado cometidos pelos seus ancestrais, levando uma vida de vitórias e derrotas. Essas derrotas se apresentam diante dos inimigos que ainda habitavam aquelas terras por desobedecerem a Deus; se apresentam diante de Deus por ter este povo voltado as costas para o Senhor; e diante de si mesmo quando se descuidam dos seus. Ao longo deste livro o povo faz as suas escolhas, porém muitas delas são escolhas erradas, levando-os a serem humilhados pelo inimigo, acendendo a ira de Deus e, consequentemente, sofrendo as dores das suas próprias escolhas.
Neste último capítulo, podemos “ouvir” o lamento de Israel em relação à tribo de Benjamim, a amargura tomando conta do coração de seus irmãos ao perceberem que quase fora dizimada uma parte do seu povo. O que fazer agora? Há situações em que não há mais nada a ser feito. Neste caso, os irmãos de Benjamim procuraram amenizar o estrago que fizeram àquela tribo. Vamos analisar o final deste ciclo dolorido que perpassou pelo povo de Deus e que trouxe humilhações, opressões, clamores e restaurações à nação israelita, a qual sempre fora escolhida, protegida, disciplinada e amada pelo próprio Deus altíssimo.
A QUASE EXTINÇÃO DA TRIBO DE BENJAMIM
É importante refletirmos sobre este episódio tão grave no meio do povo de Israel. Este povo historicamente tinha um Deus que era sobre todos os outros deuses, havia derrotado vários povos inimigos de Israel ao longo de sua jornada, fizera maravilhas no meio do Seu povo e para que os outros povos conhecessem o Seu tremendo poder; nações tremiam ao saber da aproximação do povo do Deus Altíssimo. O próprio Deus cuidava, zelava por Israel. Era, então, de se conscientizar da importância da presença de Deus em suas vidas! Tudo o que o Senhor lhes ensinou era para o próprio bem daquele povo escolhido. Talvez por isso a ênfase dada em Êxodo 20, verso 3, sobre não se ter outros deuses. O Senhor sabia que a fraqueza humana O afastaria de Israel, deixando lugar ao engano, à idolatria e a toda sorte de maldade.
Mears apresenta um panorama caótico naquele momento final, no capítulo 21 de Juízes, cujo povo encontrava-se desorientado, apesar do Senhor sempre lhes dar a direção certa, o caminho correto a seguir.1 A tribo de Benjamim, filho mais novo de Israel, cometera um erro em acobertar uma perversidade cometida por alguns homens desta tribo. Este assunto, comentado na lição anterior, tomou proporções grandiosas, pois teve como consequência quase a extinção de uma das tribos do povo de Israel. E o inimigo agora não é um povo pagão, idólatra, mas sim os próprios irmãos, de sangue e de fé. Paul Hoff faz referência a uma situação semelhante acontecida com o sobrinho de Abraão, em Sodoma relatando
O segundo apêndice revela a corrupção moral causada em parte pela influência do culto a Baal. O pecado dos “homens perversos” de Gibeá assemelhou-se aos dos habitantes de Sodoma(Gênesis 19:5), e provocou a indignação de toda a Israel. Porém os benjamitas não quiseram remediar o grande mal e foram brutalmente dizimados na guerra.
Um grande mal havia sido cometido pela tribo de Benjamim. Um ato tal qual os dos ímpios de Sodoma quando da visita dos anjos do Senhor à casa de Ló, sobrinho de Abraão. Em Juízes acontece a mesma devassidão, com um porém, neste episódio os sodomitas faziam parte do povo de Deus! Eram da tribo de Benjamim, conheciam o poder e o cuidado do Senhor, a Lei de Deus. E como de praxe, este pecado deveria ser punido. Contudo a iniquidade no meio daquela tribo parecia ser tolerada, pois ao negarem entregar os responsáveis por aquele ato pecaminoso, aceitavam aquela prática. Era necessário retirar do meio do povo de Israel, do qual fazia parte também a tribo de Benjamim, o mal que fora feito para aquele levita. “Dai-nos, pois, agora, aqueles homens filhos de Belial, que estão em Gibeá, para que os matemos e tiremos de Israel o mal; porém os filhos de Benjamim não quiseram ouvir a voz de seus irmãos, os filhos de Israel” (Juízes 20:13).
Essa negação dos benjamitas causou a sua desgraça, causou amargura e furor nas outras tribos e quase foi a sua destruição total, a ponto de quase desaparecer da descendência de Jacó. Não havia possibilidade de enfrentamento, era simplesmente desigual o combate, eram 26 mil e 700 homens contra 400.000 homens de guerra. E Deus, Deus de todas as tribos, inclusive a de Benjamim, neste capítulo da vida da nação de Israel, só foi consultado para dizer qual das tribos duelaria primeiro contra os rebeldes de Benjamim(Juízes 20:18). O Senhor parecia distante daquele povo, não havia espaço para o Seu senhorio, pois Israel “fazia o que lhe parecia reto aos seus olhos” (Juízes 21:25).
O QUE FIZEMOS?
Mesmo medidas drásticas devem ser analisadas, estudadas, bem aplicadas. A tribo de Benjamim quase se extinguiu, e os seus irmãos acordaram para essa realidade após o massacre. Já era tarde, o outro mal já havia sido feito. Embora não sendo essa a vontade, o ato em si foi funesto e devastador. Radmacher et all, em O Novo Comentário Bíblico do AT, faz referência a esse momento de Israel:
Após a devastadora derrota de Benjamim, os remanescentes filhos de Israel foram acometidos de remorso, porque Benjamim quase foi completamente dizimada (Juízes 21:1-7). Então, o capítulo 21 relata as medidas que eles tomaram para a sobrevivência da tribo, embora os meios que escolheram fossem questionáveis e inclusive brutais.
Remorso, essa é a palavra-chave para essa ocasião. Veremos que os filhos de Israel estavam sofrendo, estavam abatidos, sentiam remorso. O versículo 3, do capítulo 21, dá-nos um panorama do sentimento que tomava aquele povo, que sofrera na própria carne a dor da perda: “Veio, pois, o povo a Betel, e ali ficaram até à tarde diante de Deus, e levantaram a sua voz, e prantearam com grande pranto. 3 E disseram: Ah! SENHOR, Deus de Israel, por que sucedeu isto em Israel, que hoje falte uma tribo em Israel?”. Podemos perceber que havia grande comoção entre os israelitas, aparentemente não pelo que tinham feito, mas pelo que havia acontecido a tribo de Benjamim. E mais: ainda havia um voto feito para que nenhuma filha das outras tribos fosse dada em casamento para qualquer homem da tribo de Benjamim(Juízes 21:1). Contudo o cenário era tenebroso.
Dos benjamitas, apenas 600 homens conseguiram escapar com vida, não havia como a tribo se reerguer. Como remediar essa situação? Os israelitas percebiam a gravidade da situação, porém o voto não poderia ser quebrado, e ao mesmo tempo não poderiam deixar a tribo de Benjamim perecer. Cundall & Morris também comentam sobre esse momento angustiante pelo qual passava Israel:
Passado o fragor da batalha, e arrefecido seu calor, quando a memória dos eventos vergonhosos dos primeiros dois dias foi colocada numa perspectiva mais sadia pela vitória final, os israelitas tiveram ocasião de refletir e arrepender-se. A ação deles se justificava pelo ultraje dos homens de Gibeá, e a guerra que travaram foi, num certo sentido, uma guerra santa. Contudo, ela trouxera, em seu bojo, a consciência de uma fraternidade rompida, e a percepção de que, no calor da crise, houvera votos extremados. Tornasse óbvio, neste estágio, o sentimento profundo de unidade, nem sempre prevalecendo nas gerações posteriores. Eles lastimavam, de modo especial, o voto solene que fizeram de impedir quaisquer casamentos entre suas filhas e os homens de Benjamim, visto que tal proibição significava que uma das tribos de Israel pereceria, inevitavelmente.
Para remediar uma situação, provocaram uma outra situação drástica, a matança do povo de Jabes-Gileade, que não quiseram ajuntar-se aos outros israelitas para enfrentarem a tribo de Benjamim, deviam apenas deixar vivas as virgens daquele lugar para que fossem entregues aos sobreviventes benjamitas. Mas o número de virgens que havia em Jabes-Gileade, 400 mulheres, não era suficiente para os 600 homens que sobraram. “E, ao mesmo tempo, voltaram os benjamitas, e deram-lhes as mulheres que haviam guardado com vida, das mulheres de Jabes-Gileade; porém estas ainda lhes não bastaram. Então, o povo se arrependeu por causa de Benjamim, porquanto o SENHOR tinha feito abertura nas tribos de Israel” (Juízes 21:14,15). Havia um problema: um terço dos benjamitas que sobraram ficariam sem mulher para constituírem família e tornarem a tribo de Benjamim outra vez próspera.
Sabiam os filhos de Israel que não fora suficiente o seu esforço, mas sabiam também que não poderiam quebrar o seu voto. E isto era levado muito a sério pelo povo de Israel. Podemos verificar na Bíblia que uma vez feito voto, este deveria ser cumprido com pena de ser castigado aquele que descumprisse tal acordo. Em Números 30:2 fica claro isso: “Quando um homem fizer voto ao SENHOR ou fizer juramento, ligando a sua alma com obrigação, não violará a sua palavra; segundo tudo o que saiu da sua boca, fará”. Outro versículo que enfatiza essa questão do voto como obrigação a ser cumprida se encontra em Deuteronômio 23:21: “Quando votares algum voto ao SENHOR, teu Deus, não tardarás em pagá-lo; porque o SENHOR, teu Deus, certamente o requererá de ti, e em ti haverá pecado”. E os votos feitos deveriam ser logo pagos, “Quando votares algum voto ao SENHOR, teu Deus, não tardarás em pagá-lo; porque o SENHOR, teu Deus, certamente o requererá de ti, e em ti haverá pecado” (Eclesiastes 5:4).
Ou seja, podemos entender o sofrimento daqueles que se angustiavam pela tribo de Benjamim, pois fizeram um voto de não entregar nenhuma filha sua a esta tribo, mas sabiam também que os benjamitas não se reergueriam como tribo sem terem mulheres suficientes. Então usaram de artimanha para que se suprisse o restante de mulheres que faltavam, e isso seria roubar as mulheres da cidade de Siló. Às vezes atos inconsequentes, embora pareça o certo a fazer, geram sofrimentos desnecessários. Israel estava ferido com o ato iníquo dos benjamitas, era mister que algo fosse feito para reparar o erro daquela tribo, no entanto não se procurou Deus para que Ele dissesse o que era melhor a ser feito, simplesmente se juntaram já perguntando a Deus que tribo iria primeiro ao combate.
CADA UM FAZIA O QUE ERA RETO AOS SEUS OLHOS
“Cada um fazia o que era reto aos seus olhos”; “E voltaram a fazer o que era mal perante o Senhor”; “Naquela época não havia rei em Israel”, essas são frases recorrentes no livro de Juízes, que nos levam a refletir sobre o que é certo e o que é errado. Vamos observar a primeira frase, “Cada um fazia o que era reto aos seus olhos”. O que é reto, certo, correto para você e para mim? Somos, muitas vezes de culturas diferentes, educação diferente, visão de mundo diferente. Em algumas coisas podemos ser coincidentes, é claro. No entanto, quando se trata de comunhão, de união, de uma mesma comunidade, é imprescindível que tenhamos os mesmos propósitos, os mesmos objetivos. Se temos pontos de vista diferentes, de alguma forma não nos acertaremos satisfatoriamente.
Tratando-se do povo de Deus, é de suma importância que estejamos sob o Seu senhorio, pois Ele sabe o dia de amanhã, consequentemente, o que será melhor para nós no futuro. Essa frase “E voltaram a fazer o que era mal perante o Senhor”, revela um afastamento de Deus, revela uma falta de intimidade com o Senhor, revela um certo orgulho em poder fazer o que se quer sem consultar o Deus único. Com um agravo, tornam a fazer aquilo que desagrada a Deus, ou seja, não aprendem com os próprios erros, mas tornam a errar. Os erros, os pecados são normais pela própria natureza pecaminosa do homem, porém aquele que já conhece ao Senhor deveria saber sobre o que agrada e o que não agrada a Deus e evitar desonrar o amor do Senhor e a Sua justiça. Persistir nos mesmos erros é demonstrar tolice ou rebeldia.
“Naquela época não havia rei em Israel”, todavia Deus os orientava, guiava-os e os ensinava em tudo que era necessário, desde alimentar-se corretamente até administrar uma comunidade. Temos um grande exemplo na figura de José, filho de Jacó, “E esta palavra foi boa aos olhos de Faraó e aos olhos de todos os seus servos. E disse Faraó a seus servos: Acharíamos um varão como este, em quem haja o Espírito de Deus? Depois, disse Faraó a José: Pois que Deus te fez saber tudo isto, ninguém há tão inteligente e sábio como tu. Tu estarás sobre a minha casa, e por tua boca se governará todo o meu povo; somente no trono eu serei maior que tu” (Gênesis 41:37-40). Quem na verdade era o rei de José senão somente o próprio Deus. E José confiava em toda a palavra de Deus, foi fiel até o fim, e por isso evitou que milhares morressem de fome, incluindo a sua própria família. José não fazia o que era reto aos seus olhos, mas o que era reto aos olhos de Deus.
NÃO HÁ LÍDER, NÃO HÁ LEI
O povo de Israel tinha, sim, um Líder. E Ele estava sempre com o Seu povo. Seu povo não O aceitava o tempo todo, saía de Sua presença para fazer o que lhe convinha. Havia Lei, dada pelo próprio Deus, escrita pelo Seu próprio dedo. Contudo o povo preferia adorar a outros deuses. O último versículo do livro de Juízes, 25, parece-nos desolador, aparentemente o Senhor abandonara os israelitas “Naqueles dias, não havia rei em Israel, porém cada um fazia o que parecia reto aos seus olhos”. O comentário de Mark Dever é oportuno, pois o passado do povo de Israel é retumbante, cheio de maravilhas feitas pelo Senhor Deus, como poderia então esquecer-se tão rápido de todo o cuidado que o Senhor teve com ele? Dever diz “Deus não lhe dará apenas um novo chefe, um novo guru, um novo modelo ou um novo presidente; Ele lhe dará uma nova identidade, uma nova visão, um novo início com o Senhor”. Desde a saída do Egito, Deus era com o Sem povo, mas Seu povo ainda não O via como um Líder que legislava em causa de Israel. E assim se passaram aproximadamente 300 anos, de bênçãos, de derrocadas, de clamores, de perdão e novamente de bênçãos, ciclo após ciclo, retrato do livro de Juízes.
CONCLUSÃO
Como foi dito no início: “Melhor aprender com os erros alheios, do que na própria carne”. O livro de Juízes é um grande exemplo para todos nós que temos Deus como Pai. Podemos aprender pelo que é contado na história dos hebreus, ou podemos aprender com os nossos próprios sofrimentos. Deus sempre nos dará a escolha e também o caminho certo. Todavia Ele alerta para o perigo que corremos em desobecê-lO. Estudamos mais amiúde este livro com tantos conflitos, com tanta desobediência, com tanta tristeza, e tudo isso causado pela falta de fé, pela falta de fidelidade ao Senhor de um povo abençoado já em Abraão. O que nos parece é que necessitamos de uma pessoa de carne e osso à frente para tomar decisões e dar ordens para que creiamos em um Deus infinito e poderoso. Tantos juízes foram levantados por Deus para liderar o Seu povo, mas como o homem é finito, logo após a morte deles, Israel pecava. Se precisamos de homens para sermos vencedores, então nosso foco está errado, e, de acordo com a Palavra, aquele que crê em Cristo Jesus já é mais do que vencedor. Que o nosso juiz seja sempre o Senhor!
PERGUNTAS PARA DISCUSSÃO EM CLASSE
1 – Comente em classe qual é a função de um líder.
R.
2 – comente em classe o que mais lhe chamou a atenção em relação às atitudes das tribos que atacaram a tribo de Benjamim.
R.
3 – Algumas decisões tomamos impensadamente, e com certeza, a maioria delas não tem boas consequências. Como você entende as decisões de ambas as partes de Israel que entraram em conflito interno, a tribo de Benjamim e as outras tribos?
R.
4 – Ao se arrependerem, as tribos tomaram uma decisão também drástica. Para você, que outra opção poderia ter-se optado para que não houvesse outra matança?
R.
5 – Escreva com suas próprias palavras como você entende o final do livro de Juízes quando o escritor diz “Naqueles dias, não havia rei em Israel, porém cada um fazia o que parecia reto aos seus olhos”?
R.
1 MEARS, Henrietta C. Estudo Panorâmico da Bíblia. Traduzido por Mazinho Rodrigues. Flórida. Ed. Vida. 1982, pág. 96
2 HOFF, Paul. Livros Históricos: A Poderosa Atuação de Deus no Meio do seu Povo. S. Paulo. Ed. Vida, pág. 89
3 RADMACHER Earl D. et all. O Novo Comentário Bíblico do AT. R. de Janeiro. Ed. Central Gospel. 2010, pág. 489
4 CUNDALL, Artur E.; MORRIS, Leon. Juízes e Rute: Introdução e Comentário. Tradução de Oswaldo Ramos. S. Paulo. Ed. Mundo Cristão. 1986, pág. 198
5 DEVER, Mark. A MENSAGEN DO ANTIGO TESTAMENTO: Uma Exposição Teológica e Homilética. Traduzido por Lena Aranha. R. de Janeiro. CPAD. 2008, pág. 224