Texto de Estudo

Bendize, ó minha alma, ao SENHOR, e não te esqueças de nenhum de seus benefícios.

Salmos 103:2 

INTRODUÇÃO

O salmista Davi convida-nos a dar graças a Deus pelas misericórdias que nos alcançam de maneira particular, bem como pela graça que Deus concede a todos que O servem, fazendo um pacto de salvação, incluindo-nos como participantes de Sua adoção. Essa magnifica misericórdia sustenta-nos e nutre; e isso ocorre não por conta dos nossos méritos (de fato, merecíamos eternos castigos), mas porque Ele se compadece de nossa fragilidade. O Salmos 103 é um espetacular hino de louvor ao Criador.

O texto foi celebrado em muitas igrejas, enriquecendo orações e liturgias. Foi tema da Cantata, de Johann Sebastian Bach. Nesse Salmo, encontramos a visão do salmista sobre Deus. Davi busca registrar, em poesia, a imagem divina. E as implicações dessa imagem para a teologia é que buscaremos analisar. Cabe ressaltar as limitações que temos em analisar um texto “estranho” à nossa cultura e tempo, baseado em outro modo de enxergar a realidade e expressá-la.

 

A POESIA: UMA TENTATIVA HUMANA DE TRADUZIR QUEM É DEUS

O Salmo em questão surge de uma experiência profunda com Deus. A poesia é, sem dúvida, o melhor recurso literário para expressar a experiência com o “mistério”, ou seja, aquilo que supera o palpável pela lógica humana. A linguagem poética consegue, por meio de sons, ritmos, ideias e imagens, tecer uma trama a permitir que a Palavra reverbere com sabedoria no corpo.

Considerando sua estrutura, o Salmos 103 é composto por cinco estrofes. As do começo (1-5) e as do final (19-22) também se correspondem. Nas duas, há o imperativo para o louvor. Sendo que, na primeira estrofe, o convite ao louvor é pessoal, dirigido ao interior da pessoa. No último convite ao louvor, abrange-se todo o universo. Toda a criação é motivada a louvar. Observe, pois, a seguinte estrutura:

A: 1-5: Louvor pessoal;

B: 6-10: Deus liberta Seu povo;

C: 11-13: Deus é amor;

B`: 14-18 – Deus inclina-se ternamente diante da fragilidade humana;

C`: 19-22 – Louvor Universal.

Neste comentário, serão abordados os principais atributos que o salmista declama sobre Deus e a maneira como devemos nos relacionar com o Pai Celestial.

 

DEUS É AMOR!!!

Eis o coração do Salmo. O salmista põe todo o seu ser num poderoso coro de louvor para declarar o atributo divino que sustenta o universo. O texto reflete a intensidade de sua relação com Deus e demonstra o fervor de sua vida espiritual.

Parece que a origem do Salmo relaciona-se ao profundo sentimento de gratidão de um indivíduo a Deus, pelo perdão dos pecados e pela restauração de uma enfermidade desesperadora [...] Heinrich Herkenne observa, de forma acertada, que dificilmente uma outra parte do Antigo Testamento mostre-nos a verdade de que Deus é amor tão intimamente como nesse texto.

 

DEUS CONOSCO!!!

            Davi, como em outros Salmos, enfatiza Deus e Seu relacionamento humano. Nosso Pai não é visto como um poder distante. Não é apenas “outro” ser admirável e temível. Não é um deus relojoeiro que colocou o universo em movimento e depois se retirou por haver perdido o interesse por Sua criação. O salmista declara que Ele é a Pessoa revelada de maneira clara, ao aproximar e interagir com a humanidade. E a melhor forma de conhecer ao Senhor é observando como se aproxima de nós, ansioso para perdoar, repleto de compaixão paterna, amando sem cessar os que se voltam para Ele e que n’Ele confiam.

            Por isso, o primeiro verso lembra-nos de que o Senhor é a causa primeira do nosso louvor. Bendiga não ao homem, ou à sorte; e, sim, ao Senhor.

 

Bendiga ao Senhor, sempre com intensidade

            O Salmo é uma ação de graças, em correspondência ao benefício recebido. A palavra louvor, literalmente, quer dizer abençoar, palavra no Antigo Testamento para expressar conhecimento e gratidão.  Ao nos convidar a dar graças, com todo o nosso interior, e ao dizer “todo”, o orante pode incluir coração, rins e câmaras do ventre. Ou seja, todo o mundo cognoscitivo, volitivo, emocional, passional, imaginativo etc. Trata-se de uma verdadeira mobilização do orante”.

            O salmista começa com uma experiência pessoal, ministrando com o próprio exemplo uma lição sobre o dever que pesa sobre cada ser humano. O Espírito Santo, por meio desse Salmo, conduz-nos a corrigir a apatia e sermos mais diligentes em louvar ao Senhor. Quando Davi afirma que TODO o seu ser louvaria a Deus, é como se, removido da presença dos homens, examinasse a si mesmo diante do Pai. Ao repetir no verso dois que a sua “alma bendize ao Senhor”, torna sua linguagem ainda mais enfática. Com isso, pretende reprovar a própria indolência.

            João Calvino questiona como é possível sermos tão apáticos na realização do primordial exercício da verdadeira adoração, senão por que nosso deplorável e perverso esquecimento no coração dos inumeráveis benefícios de Deus, os quais publicamente manifestam o céu e a Terra? O teólogo conclui: para que pelo menos retenhamos a lembrança deles, o profeta assegura que devemos estar suficientemente inclinados à realização de nossos deveres, já que a única proibição que Deus impõe é que não os esqueçamos.

 

Bendiga ao Senhor pelos seus benefícios

            Perdão, poder para cura, proteção da vida, provisão para cada necessidade e promessa para o futuro estão incluídos nesses benefícios. E todos os relatados mostram o contexto que o salmista vivencia. Ele sente-se resgatado da “cova”, libertado da morte que o espreitava devido à doença mencionada no verso 4.

Infelizmente, o mundo evangélico da atualidade entende que os benefícios são relacionados aos bens materiais. Sendo antagônico a tal pensamento, Davi deseja que sua alma (como que falando consigo mesmo) louve e bendiga a Deus em todas as coisas. Ele é desejoso de que seu coração jamais de aparte dos preceitos de Deus. O salmista deseja para si que ele não se esqueça de nenhum dos benefícios recebidos de Deus. Quão distante muitas vezes nos encontramos de tal desejo. Como constantemente temos nossos desejos enegrecidos pela falsa sensação de autocontrole ou a busca por recompensas materiais.

           

A ANTIGUIDADE DA ÁGUIA

            O Salmo em estudo traz a certeza de que Deus renova nossa força interior. E o salmista utiliza-se da águia para explicar a extensão dessa força. Veja a seguinte citação:

 

E assim, para expandir a presente passagem, realçam que as águias, a cada 10 anos, sobem ao fogo elementar para que suas penas sejam queimadas e, então, mergulham no mar e, imediatamente, nascem-lhes novas penas. Mas podemos facilmente deduzir a simples intenção do profeta que extrai da natureza da águia, como descrita pelos filósofos e à qual é bem conhecida pela observação. Essa ave continua nova e vigorosa, mesmo em idade extrema, sem se enfraquecer pelos anos e isenta de doenças até que, finalmente, morre de fome. É certo que ela vive muito; mas, por fim, seu bico cresce tanto que não mais pode comer e, consequentemente, vê-se forçada a sugar o próprio sangue para nutrir-se. Daí o antigo provérbio em referência aos homens idosos que se habituam a beber a antiguidade da águia; porque, então, a necessidade constrange as águias a beberem muito. Mas, como só a bebida é insuficiente para manter a vida, elas morrem mais de fome do que por decadência das energias e por fraqueza natural. (...) o genuíno significado do profeta, a saber: que, como a águia sempre retém seu vigor, e ainda em sua velhice continua jovem, com vistas a que os santos se sentissem sustentados por uma influência secreta derivada de Deus, por meio da qual continuassem de posse daquele vigor inalterado. É verdade que eles nem sempre têm seu corpo robustecido enquanto peregrinam por este mundo; ao contrário, arrastam dolorosamente suas vidas em contínua fraqueza; contudo o que se diz aqui se aplica a eles, em certo sentido. Isso é, inquestionavelmente, comum a todos em geral, ou seja, que têm sido arrancados da sepultura e experimentam aquela liberalidade que Deus concede-lhes de inumeráveis maneiras.

 

O poeta reconhece que as oportunidades oferecidas pela vida ainda ficam abertas diante dele como nos dias ensolarados de sua juventude. Devemos refletir que não podemos nos acomodar em nossa religiosidade e tradições. Há uma clara necessidade de reflexão frequente acerca das motivações sobre a prática cristã e eclesiástica. Se demonstramos uma fadiga espiritual, cansados de orar, ler a Palavra de Deus, ir aos cultos e crer no Deus poderoso e vivo que cura, salva e perdoa, nesse Salmo, Deus promete renovar as nossas forças espirituais e manter o frescor de nossa fé e amor em Cristo.

 

A HISTÓRIA DE ISRAEL CONFIRMA QUE DEUS É MISERICORDIOSO

            Davi sabia que não eram suas boas obras e própria justiça que perdoavam as iniquidades, mas a graça de Deus. É o Senhor que faz justiça e julga a todos os oprimidos, porque julga todas as causas e até mesmo atos de suas vidas que, na grande maioria, jamais serão julgados pelos magistrados da Terra. Não é comum que pessoas necessitadas sejam julgadas com justiça e misericórdia por muitos deles.

            A História de Israel revela que Deus é cheio de misericórdia e longânimo, ou seja, tardio em se irar e grandemente benigno. Há maior exemplo do que a vida de Davi?! Ele teve a experiência de que o Senhor não repreende perpetuamente, nem conserva para sempre a Sua ira, pois Ele mostra-Se perdoador e consolador para todo aquele que se arrepende. Deus não lida conosco segundo os nossos pecados, nem nos retribui segundo as iniquidades; caso contrário, não nos deixaria viver tantos anos na Terra. Logo executaria um juízo de condenação sobre nós, porque a Sua justiça não pode tolerar um só pecado. No entanto, Ele equilibra justiça com misericórdia, Seu grande amor, bondade e longanimidade.

            Sob essa perspectiva, Israel vê as origens do mundo, das civilizações e do próprio povo escolhido como expressão da misericórdia divina. Assim, desde as primeiras páginas da Bíblia, manifesta-se a misericórdia de Deus para com todas as Suas criaturas. Toda a obra da criação é fruto da bondade de Deus.

 

OS BENEFÍCIOS DIVINOS SÃO DELIBERADOS

            O Salmos 103 é enfático ao afirmar que Deus dispensa os Seus benefícios da forma como quer, indiscriminadamente. Assim, até mesmos os ímpios, que não reconhecem a Sua existência e muito menos a Sua bondade, beneficiam-se.

            Será que merecíamos os benefícios divinos? Por nossos pecados e transgressões, NÃO!!! Mas Davi afirma que Deus não nos tratou segundo os nossos pecados e não recompensou de acordo com as nossas transgressões. E eis a maior motivação para mantermos uma fé fiel e intensa em nosso Pai Celeste.

            Assim, tendo isso em mente, só podemos bendizer o Deus de toda a Graça, por tudo quanto temos recebido de Suas mãos, e pelo que havemos de receber. Embora alguns desses benefícios “terrenos” sejam incertos para nós, pois podemos ser privados por algum tempo, há algo que Deus prometeu nunca reter de nós: o Seu amor.

            Se formos ingratos apesar de tudo isso, não seremos menos culpados que os israelitas no deserto, a quem julgamos infiéis. Vale ressaltar que temos uma grande vantagem sobre aquele povo que saiu do Egito - AS ESCRITURAS SAGRADAS, a Palavra completa, com o que Deus quis nos revelar. Elas servem de alerta ao cristão sobre as condutas reprováveis.

 

CONCLUSÃO

            Portanto, bendiga ao Senhor por cada um dos Seus benefícios e tente não se esquecer de nenhum. Devemos agradecer até mesmo pelos que parecem fazer parte do nosso dia a dia, automaticamente.

            Tanto na bonança quanto na dor, não se esqueça de bendizer ao Senhor pelo maior de todos os benefícios: a Graça salvadora e libertadora alcançou-nos! Temos acesso à Sua Santa Palavra, pela qual somos inteirados acerca de tudo quanto precisamos saber - sobre nosso Deus, sobre nós mesmos e sobre o cuidado de Deus para conosco. 

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