Portanto, como por um homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado a morte, assim também a morte passou a todos os homens por isso que todos pecaram.    

Romanos 5:12 

INTRODUÇÃO

   Antes de iniciar a resposta à sugestiva pergunta estampada no título deste estudo bíblico, convém uma breve reflexão, ainda que repetitiva haja vista as anteriores abordagens , a respeito do conceito de pecado e seus desdobramentos na Teologia Bíblica. Oportuno se esclareça, já de início, que, em geral, são usados indistintamente os vocábulos pecado (no singular) e pecados (no plural). Aliás, nem mesmo os escritores bíblicos se ocupam em estabelecer alguma distinção peculiar. Entretanto, quando a Teologia Sistemática alude a esse vocábulo (no singular), quer tratar, em verdade, do sistema do mal que reina no mundo. Refere-se, portanto, à inata assimetria e inimizade do homem para com Deus, à hostilidade para com Deus, ao pendor da carne, enfim, à inclinação natural para o mal.

   Já quando se refere ao mesmo vocábulo no plural, tem em mira os atos pecaminosos nas suas multifacetadas formas de ilicitude, rebelião e desconformidade à vontade de Deus. Afigura-se adequado, nesse passo, trazer à memória parte do texto por mim redigido em outro estudo bíblico, a respeito de algumas afirmações de Jean-Jacques Rousseau sobre a natureza do homem. À ocasião, assentei: Discordamos, pois, com base na Santa Bíblia, de sua assertiva de que o homem nasce bom, mas a sociedade o corrompe. Com efeito, não é esse o ensino bíblico. Bom só existe um (Mat. 19:17), disse Jesus. Da mesma forma, para Rousseau, o homem nasceria livre, mas por toda parte se encontraria acorrentado por fatores como sua própria vaidade, fruto da corrupção do coração. Mas, a Bíblia diz: Eu nasci na iniquidade e, em pecado me concebeu a minha mãe (Sal. 51:5).

   Concordo com o Pastor Doutor George R. Knight quando assevera que um dos grandes fatos da vida é o problema do pecado. Deparamo-nos com ele por todos os lados. Uma prova de seu poder e prevalência é o fato de cada país ter a necessidade de um exército, policiais, juízes, tribunais e sistemas penais. O teólogo John Macquarrie dá especial relevância ao problema quando escreve que ao olharmos para a condição humana atual, percebemos um transtorno enorme na existência, uma patologia que parece se estender por toda a vida, quer a consideremos do ponto de vista coletivo, quer do individual. Reinhold Niebuhr foi ainda mais sucinto quando sentenciou: Onde há história (...) há pecado.

   Portanto, mesmo que a Bíblia não existisse, ainda haveria uma doutrina do pecado. O pecado está inscrito na própria estrutura da existência. Escritores pagãos da antiguidade, bem como filósofos, literatos, sociólogos, psicólogos, políticos e outros teóricos da atualidade, atestam-lhe a universalidade. O romancista secular John Steinbeck expressou esse conceito com exatidão ao confessar: Creio que só há uma história no mundo e apenas uma (...). Os seres humanos estão presos em sua vida, em seus pensamentos, em suas fomes e ambições, em sua avareza e crueldade, bem como em sua bondade e generosidade, em uma rede tecida pelo bem e o mal”.

   Seja qual for o entendimento que adotemos, o fato é que o pecado nos separa de Deus. O texto bíblico é de solar clareza. Quando exorta: (...) as vossas iniquidades fazem separação ente vós e o vosso Deus; os vossos pecados encobrem o seu rosto de vós para que não vos ouça (Isaías 59:2 – grifo nosso). Inegavelmente, o problema do pecado faz parte do drama da história humana. Na Bíblia o vocábulo pecado aparece pela primeira vez em Gênesis cap. 4, v. 7 quando, ao tratar com Caim, Deus afirma: (...) se não fizeres o bem, o pecado jaz à porta, e sobre ti será o seu desejo, (...)”. Presto anuência às palavras do Pastor Doutor Frederick Fyvie Bruce quando observa que a motivação por trás da Queda foi o desejo de ser independente e autossuficiente, em suma, ser igual a Deus. De posse dessa inicial reflexão, exsurgem as indagações, que a todos, em algum momento da vida, já trouxe inquietação: Como surgiu o pecado? Qual é a sua origem?

 

O QUE A BÍBLIA DIZ SOBRE A ORIGEM DO PECADO?

   Do estudo cuidadoso de capítulo 12 de Apocalipse, em sistemático cotejo com outras passagens das Santas Escrituras a respeito da rebelião de Lúcifer, somos levados à firme convicção de que ele recebeu uma derrota esmagadora. E assim se entende, primeiramente, porque ele foi expulso do Céu (verdadeiro despejo coercitivo, forçado); e, em segundo lugar, pela obra vitoriosa de Jesus na cruz do Calvário, secundada por Sua triunfante ressurreição ao terceiro dia, Seu retorno à Corte Celestial. Tudo isso terá como clímax Sua iminente e triunfante Segunda Vinda, quando virá nos buscar para eternamente vivermos no glorioso Lar dos Salvos! Conquanto assim creiamos, persistem as perguntas: De onde veio Satanás? Qual a sua origem?

   Concordamos com o Pastor Doutor Billy Graham quando, a esse respeito, escreveu: A questão que nos confunde é: Onde o mal e o pecado se originaram, e por que Deus o permitiu? A Bíblia ensina que o pecado não se originou com o homem, mas com o anjo que passamos a conhecer como Satanás. No entanto, o modo exato pelo qual o pecado se originou não é inteiramente conhecido. Trata-se de um daqueles mistérios que a Bíblia não revela em sua inteireza. De quando em vez percebemos, de relances, na Bíblia, a resposta desse enigma. No vigésimo oitavo capítulo de Ezequiel, por exemplo, vemos a descrição de um ser grande e glorioso, de quem diz o profeta: Tu eras querubim da guarda, ungido, e te estabeleci; permanecias no monte santo de Deus ... Perfeito eras nos teus caminhos, desde o dia em que foste criado, até que se achou iniquidade em ti (Ezequiel 28:14-15). Nisto temos um vislumbre de onde a coisa começou. Em algum passado longínquo a iniquidade foi encontrada no coração de uma das criaturas mais magníficas do Céu. Como essa iniquidade chegou lá, não nos dizem. Por algum motivo, não agradou a Deus revelar a resposta completa do mistério do início da iniquidade, bastando-nos saber que ela se acha no mundo e que o homem caiu sob o seu poder.

   No livro de Isaías temos outro indício sobre a origem do mal: Como caíste do céu, ó estrela da manhã, filho da alva! Como foste lançado por terra, tu que debilitavas as nações! Tu que dizias no teu coração: Eu subirei ao céu; acima das estrelas de Deus exaltarei o meu trono, e no monte da congregação me assentarei, nas extremidades do Norte; subirei acima das mais altas nuvens, e serei semelhante ao Altíssimo. Contudo, foste precipitado no reino dos mortos, no mais profundo do abismo (Isaías 14:12-15). Aqui temos um quadro do pecado de Lúcifer, a descrição da iniquidade encontrada em seu coração, mas não há explicação de como ela chegou lá.

   Com base nessas referências, ficamos sabendo que ele caiu e se tornou Satanás devido à sua ambição desmedida. De fato, o texto bíblico relata a sua origem. Entretanto, não nos foi revelado o ponto desencadeador da rebelião de Lúcifer. Logo, é demasiado temerária, visto que absolutamente insegura, qualquer tentativa de explicação como se fosse a verdade única. Por outro lado, não é menos certo que sabemos seguramente que tudo começou no Céu com a desconfiança sobre Deus e Seu caráter , que se instalou em Lúcifer. Em seguida, ao invés de ser rechaçada (retrocedendo), passou a ser por ele alimentada e, mais que isso, acariciada. A tal ponto essa incredulidade tomou corpo que, além de contaminar um terço dos anjos, desembocou em uma convulsão celestial, que culminou com sua expulsão e aterrissagem em nosso Planeta Terra. 

   A propósito, confira-se o texto sagrado: Sua cauda arrastou consigo um terço das estrelas do céu, lançando-as na terra. (...). Houve, então, uma guerra nos céus. Miguel e seus anjos lutaram contra o dragão e os seus anjos revidaram. Mas estes não foram suficientemente fortes, e assim perderam o seu lugar nos céus. O grande dragão foi lançado fora. Ele é a antiga serpente chamada Diabo ou Satanás, que engana o mundo todo. Ele e os seus anjos foram lançados à terra. (...). Portanto, celebrem-no, ó céus e os que neles habitam! Mas ai da terra e do mar, pois o diabo desceu até vocês! Ele está cheio de fúria, pois sabe que lhe resta pouco tempo (Apocalipse 12:4 7-9 e 12 – NVI).

   Após essas ponderações, tomando por base a Palavra de Deus, podemos concluir sobre as indagações lançadas acima, que nenhuma das passagens regularmente citadas como relatos da origem de Satanás são realmente sobre a origem do pecado. Ora, nesse caso, as perguntas permanecem sem uma resposta precisa. Bem, já que a Bíblia não revela a resposta na exata medida como nós gostaríamos, lanço a todos a exortação de não permitirmos que tal curiosidade nos empurre a encontrar respostas que ali não se encontrem. Dito de outro modo, não ultrapassemos as Escrituras. Somos, pois, genuínos defensores do princípio reformador “Sola Scriptura”.

   Outrossim, como batistas do sétimo dia, somos desafiados a ensinar que somente Deus (em Sua forma Triúna) é incriado, ou seja, é Eterno (nunca teve início e nunca terá fim). Portanto, tudo o mais e todos no universo são criados. Logo, Satanás é um ser criado. Não é eterno. Em nenhum lugar da Bíblia há o ensino de que ele é um ser eterno como Deus. À luz da revelação das Escrituras, somente Deus possui (em verdade, tem inerente em Si) os atributos naturais da Onipotência, Onisciência e Onipresença. Glória a Deus por isso! Portanto, somente Deus é Soberano. Mas, atenção! Não podemos ignorar nem subestimar o poder de Satanás. Porém isso não deve nos desesperar. Estamos muito confiantes e bem seguros porque sabemos que a despeito dos grandes poderes do inimigo, Deus limita seu uso (confira-se 1 Coríntios 10:13 e Jó 1:12).

   Calha assinalar, nesse cenário, que repelimos com veemência os ensinos filosófico-teológicos que sugerem a coexistência do Mal e do Bem. Assim, o engenhoso raciocínio, aparentemente irrefutável, em prol da coexistência dessa concepção cósmico-dualista, com esteio no falso alicerce de que um (o mal e/ou vice-versa) seja necessariamente contraponto para o outro, não resiste a uma acurada análise dos ensinos bíblicos. Uma coisa é certa: ninguém em são juízo e genuinamente comprometido com a Palavra de Deus (e não com este ou aquele viés hermenêutico-teológico) ousaria afirmar que Deus seja o autor do mal ou que tenha necessitado da obra de Satanás para levar a efeito a consecução e execução do Plano de Salvação aos caídos filhos de Adão.

   Avulta em importância, a esta altura, as palavras do Pastor Doutor Norman Geisler, quando pondera: Deus é absolutamente perfeito (cf. Deuteronômio 32:4; 2 Samuel 22:31; Salmos 18:30) e, sendo assim, Ele não pode nem realizar, nem produzir o pecado. Jesus declarou: Sede vós, pois, perfeitos, como é perfeito o vosso Pai, que está nos céus (Mateus 5:48). Um Ser absolutamente impoluto não pode agir de forma imperfeita; o mundo que Deus criou e tudo o que Ele continha, era muito bom (Gênesis 1:31). E da nota de rodapé, extrai-se o seguinte:

   Quando Isaías citou Deus dizendo: Eu faço a paz e crio o mal (Isa. 45:7), ele não estava sugerindo que Deus fazia qualquer coisa que fosse moralmente má. Em vez disso, ele estava se referindo ao mal físico ou às calamidades. A NVI traduz esse versículo de forma mais apropriada: Promovo a paz e causo a desgraça. (...). De forma semelhante, quando Deus permitiu aos espíritos mentirosos que fossem enganar ao Rei Acabe (em 1 Reis 22), Ele não estava pecando, tampouco incentivando o pecado. Ele simplesmente permitiu que os espíritos malignos fizessem o que Ele já sabia que eles, como seguidores do pai da mentira, fariam quando tivessem a liberdade para agir. Deus cumpriu os Seus propósitos soberanos por intermédio dessas mentiras, da mesma forma que fez por meio do pecado dos irmãos de José (vide Gên. 50:20). Adiante (...) analisaremos como a permissão que Deus concedeu ao pecado além de realizar um bem ainda maior, também preserva o amor demonstrado no ato de conceder liberdade às Suas criaturas.

   Lembremo-nos sempre: Deus não criou Lúcifer. Ele criou um anjo puro. Este se rebelou. Como? Por quê? Como assim? Não sabemos. Não nos foi revelado. Contentemo-nos com a Revelação Bíblica. Ela nos basta. É suficiente.

 

CONHECENDO ALGUNS VOCÁBULOS BÍBLICOS PARA A PALAVRA PECADO

   A Bíblia, tanto no Antigo quanto no Novo Testamento, contém diferentes vocábulos que se traduzem pela palavra pecado. Por não se tratar aqui de um estudo aprofundado em Teologia, somado à escassez de tempo e espaço, limitar-nos-emos a algumas breves alusões. Digno de nota é a informação de que o substantivo mais usual no Novo Testamento é hamartia (grego ἁμαρτίαν) e ocorre 227 vezes em diversas formas. A metáfora por trás da palavra é errar o alvo. O Pastor Doutor Harold L. Willmington, nessa linha de pensamento, prelecionou que

   a Bíblia usa inúmeras palavras para referir-se ao pecado. Existem, pelo menos, oito palavras básicas para o pecado no Antigo Testamento e uma dúzia delas no Novo Testamento. Juntas, elas fornecem conceitos básicos envolvidos na doutrina.

   O pecado pode ser apropriadamente definido por meio do uso dessas palavras descritivas de suas diversas formas, conforme foram registradas no Antigo e no Novo Testamento. Tal definição seria precisa, porém longa. Por isso, talvez seja uma boa ideia definilo da seguinte forma: o pecado é errar o alvo, maldade, rebelião, iniquidade, desvio, perversidade, inconstância, impiedade, transgressão, ignorância e apostasia (RYRIE, Charles. Basic Theology, p. 209, 212). As duas palavras mais comumente usadas para o pecado emtoda a Bíblia são khata’ (hebr.) e hamartia (grego). Em todas as suas formas, essa palavra khata’ ocorre no Antigo Testamento aproximadamente 522 vezes. Seu significado é essencialmente errar, sendo que no grego o seu equivalente é a palavra hamartano. Porém, errar o alvo também envolve atingir algum outro ponto; isto é, quando uma pessoa erra o ponto certo e, portanto, peca, ela também atinge o ponto errado. A ideia não é apenas passiva, no sentido de errar, mas também ativa no sentido de atingir. Ela é usada para denotar a corrupção moral, a idolatria e os pecados cerimoniais.

   Consoante a cátedra do grande Professor William Barclay, no grego clássico, hamartia tem por significado básico a ideia de fracasso. Hamartanein teve inicialmente o significado de errar o alvo como quando uma lança é jogada ao alvo. Pode ser usada para perder o rumo certo, para o fracasso nos planos, esperanças ou propósitos. No grego clássico essas palavras sempre estão vinculadas a algum tipo de falha negativa mais do que a algum tipo de transgressão positiva, mas no NT descrevem alguma coisa muito mais grave.

   Deve ser notado que no NT hamartia não descreve um ato específico de pecado; descreve, sim, o estado de pecado, a partir do qual surgem os atos de pecado. Essa reflexão dá margem à compreensão das palavras de Jesus no sentido de que, mesmo que alguém não tenha realizado qualquer ato material pecaminoso, ainda assim, em determinadas situações, é possível o cometimento de pecado em pensamentos. Por paradoxal que possa se afigurar, esses pecados são mais graves. Sim, porque não estão à mostra. Não aparecem. Não são visíveis. Não deixam vestígios. Ninguém vê. Mas Deus vê.

 

A CULPA HERDADA. A UNIVERSALIDADE DO PECADO

   Esse tópico poderia ter por epíteto: O Pecado Original. Imperioso se mencione, todavia, que não encontramos essa expressão na Bíblia. Ao mesmo tempo afirmamos ser bíblico seu conteúdo, visto que em toda a Bíblia essa verdade é clara e fortemente demonstrada. Anote-se que a expressão pecado original se refere a Adão após a Queda, e não antes dela. Há sérias discussões sobre isso. Todavia, é indesmentível a declaração e a demonstração de que o pecado de Adão produziu visível impacto em todos os seus descendentes e, por extensão, em toda a criação. Na Bíblia, do Gênesis ao Apocalipse, vemos o homem se rebelando contra Deus. As sequelas da queda são, pois, incontestáveis.

   Aliás, não foi por acaso que o salmista Davi escreveu: Eis que em iniquidade fui formado, e em pecado me concebeu minha mãe (Salmos 51:5). Obviamente, com isso, Davi não estava afirmando ser filho de uma relação conjugal adulterina, espúria e impura, mas sim, que trazia inoculado em seu sangue a mesma tendência de seus pais para o pecado. O verso-chave desse estudo (Romanos 5:12) traz fortíssima alusão ao chamado pecado original. Ora, o sentido nuclear desta palavra paulina é de que em Adão todos pecam: No mesmo texto e contexto da Revelação de Deus ao apóstolo Paulo, é dito que o juízo veio de uma só ofensa, e por essa ofensa de Adão “a morte reinou”, visto que por sua desobediência todos foram feitos pecadores (Romanos 5:16-19). O resultado disso é a verdade nitidamente indicada nas Escrituras sobre a pecaminosidade universal (1 Reis 8:46; Jó 14:4; Salmos 143:2; Provérbios 20:9; Eclesiastes 7:20; Romanos 3:1-23; Gálatas 3:22; Tiago 3:2; 1 João 1:8-10).

   Confira-se, pois, que é a Bíblia a infalível Palavra de Deus que afirma que todos os homens são “por natureza filhos da ira” (Efésios 2:3). Com certeza, essa expressão se conecta inseparavelmente com a doutrina do pecado original. Sim, porque com o evento da Queda, a natureza humana ficou originalmente pecaminosa, de modo que todos os descendentes de Adão e Eva, a saber, todos os homens, são partícipes desse pecado e, por via de consequência, são culpados perante o Criador.

   É de suma importância ressaltar que ao analisarmos o contexto da mensagem expressa no verso-chave deste estudo bíblico (Romanos 5:12), concluímos que o apóstolo estabelece uma verdadeira comparação entre Adão e Jesus Cristo. Não é por acaso, aliás, que Cristo, na teologia paulina, é chamado de Segundo Adão e de Último Adão. Portanto, quando Adão pecou, a abrangência de tal ato se espraiou atingindo a todos nós, a toda a humanidade. O pecado de Adão nos é imputado. Mas não se trata de um capricho ou arbitrariedade divinos, mas de uma inexorável lei natural. É da essência do ser humano, por mais elevados que sejam seus valores e sua moral, cultivar dissonância para com Deus, Sua vontade e Seus reclamos.

   Subscrevo as palavras de Billy Graham quando afirmou que todos nós estamos pendurados no cinturão de Adão. Sendo assim, forçoso se admita que a natureza humana foi totalmente depravada. A total depravação alude à abrangência da Queda alcançando toda a humanidade, mas também aos seus devastadores efeitos em cada indivíduo. Com isso, sustentamos a corrente de pensamento teológico que acredita na hereditariedade do pecado. Todos pecaram. Todos precisam de Cristo e Sua obra salvífica na cruz para alcançar a vida eterna. Não há outro meio capaz de salvar um filho de Adão. Pregamos alto e em bom som a doutrina da graça insubstituível de Deus, em Cristo Jesus.

   Em síntese, Paulo se empenha por demonstrar de modo persuasivo que onde Adão falhou, como homem que deveria ser conforme o querer de Deus, Cristo Jesus foi vitorioso sendo o homem perfeitamente afeiçoado ao ideal de Deus. E porque Ele venceu, nEle e por Ele somos mais que vencedores! (Romanos 8:37). A fé nos faz apropriar dessa verdade e nos leva a uma vida de obediência, condizente com a doutrina da Salvação.

   Assim, sem embargo dos múltiplos argumentos contrários ao ensino bíblico da hereditariedade no tocante ao pecado de Adão, o alicerce de nossa fé está calcado na revelação bíblica. Afora os textos bíblicos já mencionados, convém pinçar ainda a seguinte declaração paulina, que proclama: Sei que nada de bom habita em mim, isto é, em minha carne. Porque tenho desejo de fazer o que é bom, mas não consigo realizá-lo. Pois o que faço não é o bem que desejo, mas o mal que não quero fazer esse eu continuo fazendo. Ora, se faço o que não quero, já não sou eu quem o faz, mas o pecado que habita em mim (Romanos 7:18-20). Leia-se Jeremias 17:9.

   Muito acertadamente o Pastor W. Grudem, observou: Nessas passagens, as Escrituras não negam que os descrentes podem fazer o bem na sociedade humana em certos sentidos. Mas nega que possam fazer qualquer bem espiritual, ou ser bons no tocante ao relacionamento com Deus. Sem a obra de Cristo em nossa vida, somos como todos os outros descrentes, “obscurecidos de entendimento, alheios à vida de Deus por causa da ignorância em que vivem, pela dureza do seu coração” (Efésios 4:18)”.

 

APLICAÇÃO

   Julgo de bom alvitre trazer à reflexão nesse item algumas definições teológicas sobre o pecado, compilados pelo já mencionado Pastor Harold L. Willmington. Eis, pois, o desafio de analisar uma a uma:

   Algumas definições teológicas incluiriam:

• O pecado é uma falta de conformidade às leis morais de Deus, seja por meio de atos, disposição ou estado. — A. H. Strong

• B. O pecado é uma transgressão das leis divinas ou uma falta de conformidade a elas. — Charles Hodge

• C. O pecado pode ser definido como qualquer aspecto da criatura que não expresse o caráter santo do Criador ou que seja contrário a ele. — James Oliver Buswell Jr.

• D. O pecado é uma recusa inquieta da parte da criatura de permanecer dentro da esfera ou dos limites em que o Criador, guiado por (Sua) infinita sabedoria, colocou-a. — L. S. Chafer

• E. O pecado é qualquer falta de conformidade, ativa ou passiva, às leis morais de Deus, podendo ser uma questão de atos, pensamentos, disposição interna ou estado. O pecado é o não cumprimento de tudo aquilo que Deus espera dos nossos atos, pensamentos e ser. — Millard Erickson”.

 

CONCLUSÃO

   Amada Igreja, todos sabemos que desde a queda de nossos primeiros pais, a vida do ser humano ficou marcada pela tragédia, porquanto passou a ser um prisioneiro do pecado, nele ficando enjaulado. Vive, desde então, um vazio existencial que só pode ser preenchido por Cristo Jesus. Entretanto, devemos sempre expressar nossa gratidão a Deus pela maneira como Ele tratou os nossos pecados. Quando recebemos Cristo como nosso Salvador, a Justiça de Cristo nos é imputada e assim, os nossos pecados do passado são perdoados (Justificação); na sequência, Ele nos confere graça e poder para experimentar a vitória sobre o pecado presente (Santificação); e, nessa marcha, somos conduzidos à total erradicação do pecado no futuro (Glorificação).

   Com esse enfoque pedagógico compreendemos com mais facilidade as expressões paulinas indicativas de salvação em três tempos diferentes, a saber, no tempo passado, no tempo presente e no futuro. Citando Charles W. Colson, o Pastor John MacArthur escreveu:

   O mito de que a humanidade é basicamente boa ilude as pessoas e as leva a pensar que são sempre vítimas e nunca vilãs, que são sempre privadas e nunca depravadas. Isso isenta as pessoas de responsabilidade tanto quanto o ensino de uma época mais obscurecida. Isso pode desculpar qualquer crime, pois sempre é possível culpar alguém um desvio da nossa sociedade ou da mente.

   Um escritor chamou a Era Moderna de: ‘A época áurea da exoneração’. Quando a culpa é descartada como a ilusão das mentes estreitas, então ninguém é responsável, mesmo para a sua própria consciência. A ironia reside no fato disso ter surgido justamente neste século, dentre todos os outros, com seus Gulags e seus campos de morte e extermínio. Como G. K. Chersterton disse uma vez: ‘A doutrina do pecado original é a única filosofia empiricamente válida por séculos de registros da história humana’”.

   Enfim, fica aqui lançado o desafio para que ninguém brinque com o poder destruidor do pecado. Atentemos ao rigor do cenário descrito pelo autor da Epístola aos Hebreus, que afirma: Ora, na vossa luta contra o pecado, ainda não tendes resistido até ao sangue (Hebreus 12:4). Com efeito, uma luta assim pressupõe um inimigo assaz ardiloso e perigoso. Como se vê, o pecado precisa ser combatido, haja vista o mal que traz a todos, inclusive à vida da igreja. O sangue de Jesus já foi derramado. Aleluia!

   Mas, lembre-se sempre: conquanto Cristo, com Sua morte na cruz, tenha garantido a todos a vitória sobre o pecado, aqueles que O aceitam prosseguem travando batalhas diárias. Qual o segredo da vitória? Sem sombra de dúvida, a mais poderosa arma de vitória sobre o pecado é o cultivo de comunhão com Deus pela prática da oração. O refrão de um velho hino, com aguda precisão, diz: Jesus teve completa vitória, porque sempre viveu em oração. Chegarão muitos santos à Glória sob o manto da doce oração”.

 

QUESTÕES PARA REFLEXÃO EM CLASSE

   Quais os fundamentos bíblicos para reconhecimento da universalidade do pecado? Consulte 1 Reis 8:46; Jó 14:4; Salmos 143:2; Provérbios 20:9; Eclesiastes 7:20.

R.

2. Cotejando os textos bíblicos acima indicados à luz dos comentários desta lição, como entendemos a ideia de pecado original?

R.

3. Se o pecado se caracteriza por um relacionamento quebrado com Deus, qual a importância da graça, como também da fé, para a restauração desse relacionamento?

R.

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