Texto de Estudo

Êxodo 20:13:

13 Não matarás.

 

INTRODUÇÃO

Enfrentamos uma onda de violência contra a vida, crimes brutais acontecem diariamente e fazem vítimas em todas as classes sociais. Por isso, mais do que nunca, é necessário voltar-se a Deus, o autor da vida, e ouvi-lo sobre isso. Qual será a vontade do Senhor para com seu povo? Como lidar com a vida humana quando torna-se tão desvalorizada? 

Estudar o sexto mandamento faz-nos lembrar que a vida é um dom de Deus e, como tal, deve ser preservada. Trata-se de um assunto profundo, e não será possível esgotá-lo na presente lição; em linhas gerais, é fundamental entender a importância e sua aplicação tanto no Novo Testamento quando em nosso viver diário. 

 

O MANDAMENTO EM SEU CONTEXTO

Deus entregou a lei ao seu povo como normativa às vidas religiosa e civil. Assim, além de deveres para com o Criador, há os deveres para com o próximo, e tais normas fazem-se necessárias na relação social e para o desenvolvimento de um Estado. Foi na passagem da escravidão a um país livre que os mandamentos foram aplicados. E, para melhor compreensão deste em questão, estabelecem-se algumas observações.

Primeiramente se deve levar em conta a gravidade do homicídio, pois trata-se do maior crime que alguém pode cometer; afinal, por direito de criação, a vida pertence a Deus e cabe a ele a decisão final sobre ela. Portanto, o sexto mandamento garante este princípio: respeito à vida criada por Deus, à sua imagem e semelhança (Gênesis 1:26-28). É contra Deus que o homicida está desferindo seu golpe ao tirar a vida de alguém, pois a imagem é a representação de uma pessoa ou coisa ; no caso, de Deus. Então, a valorização da vida passa pela valorização também de seu criador; atentar contra um é ferir o outro. 

Em segundo lugar, observamos que há pelo menos nove palavras em hebraico traduzidas no Antigo Testamento, por “matar”. Isso é demonstrado na tabela a seguir . Levemos em conta tais termos, pois todo o ensino em torno do assunto dependerá de como cada forma foi usada em seu contexto. Sendo assim, não se corre o risco de cair em contradição e, o pior, pensar que Deus é contraditório em seus ensinos e em sua natureza. 

 

 

Palavra em HebraicoSignificadoOcorrência

RatsahAssassinar, matar injustamente e com violência.Êx 20:13

HragMatar, destruir, golpear.Gênesis 4:8

ZavahSacrificar, abater (animais ou pessoas).2 Reis 23:20 1 Samuel 15:22

TavahAbater, trucidar, matar, massacrar (pessoas ou animais em guerra).Isaías 34:2 6; Jeremias 48:15

(Ta)mutMorrer, matar, mandar executar.Gênesis 2:17; 18:25 1 Reis 17:18

NachaahFerir, golpear, abater, matar.Êx 21:12;  Números 22:23; Êx 7:17; 17:6

NaqphPôr abaixo, derrubar, cortar.Jó 19:26

QatalMatar.Jó 13:45; 24:14; Sl139:19

ShahatExecutar, matar, abater.Gênesis 37:31; Isaías 57:5;  Ezequiel 16:21

 

 

O vocábulo hebraico usado no sexto mandamento é Ratsah, ou seja, a proibição relaciona-se à morte violenta e injusta. Sua melhor tradução seria “não cometa assassinato”. O que fica claro pelo emprego de outros termos é que nem toda a morte era, terminantemente, proibida no Decálogo; e, sim, a ligada ao assassinato premeditado, violento, sem motivo. Resumindo, a morte injusta. 

A terceira observação feita é que “não matar” já era bem conhecido no mundo antigo, como vemos entre mesopotâmios, egípcios, gregos, dentre outros. E, mesmo que não tenha sido revestido de autoridade divina, recebeu destaque o Código de Hamurabi (1750 a.C) , que estabeleceu paralelos parecidos com o Decálogo de Êxodo 20. Isso destaca o princípio de preservação e de valorização da vida humana e do homem em suas relações sócias, mesmo antes que a lei fosse dada. 

Ademais, deve-se observar a partícula negativa “lô” (traduzida por “não”). Isso torna a ordem enfática, sem concessões ao mandamento (uma tradução bem apropriada seria “jamais cometa assassinato”) . Portanto, significa que, de forma alguma, o assassinato deve ocorrer. Eis a ordem expressa de Deus. E a transgressão da lei constitui pecado deliberado contra a santidade de Deus e da vida. 

Outra observação a ser feita é em relação às mortes ocorridas no Antigo Testamento, em alguns casos aprovada (ou mandada por Deus). O que se deve observar é que a própria lei já estabelecia a pena de morte em casos específicos. Vejamos alguns:

a) Assassinato premeditado (Êx 21:12-14);

b) Sequestro (Êx 21:16; Deuteronômio 24:7);

c) Adultério (Levíticos 20:10 Deuteronômio 22:22);

d) Homossexualismo (Levíticos 20:13);

e) Incesto (Levíticos 20:11-14);

f) Bestialidade (Êx 22:19; Levíticos 20:15-16);

g) Ferir ou amaldiçoar os pais (Êxodo 21:15; Levíticos 20:9; Provérbios 20:20);  

h) Falsas profecias (Deuteronômio 13:1-10).

 

Outros casos ainda são citados, por exemplo, quando Saul foi punido por poupar a vida do rei amalequita, Agague (1 Samuel 15:32-33). O que se observou, nesse caso, foi a aplicação da pena capital sobre Agague uma vez que havia passado outros a fio da espada. Em situações de morte de nações praticamente inteiras ocorreu o mesmo, ou seja, o juízo divino fora aplicado como retribuição ao mal praticado. Assim, não há contradição alguma entre tais ocorrências ao sexto mandamento, pois os motivos justificaram as mortes, que tinham uma razão maior para acontecerem. Talvez a questão possa parecer absurda para o homem moderno, já que vive em uma sociedade evoluída e civilizada. Todavia, se analisada à época, desaparecerão contradições, assim como motivos para crer em um Deus que ora diz não, ora diz sim à morte.

A quinta observação é sobre alguns homicídios ocorridos no Antigo Testamento e como cada um foi tratado. Analisemos um por vez: 

Homicídio doloso (Números 35:16-21). Foram dadas instruções específicas acerca do procedimento jurídico desses tipo de homicídio. Se alguém ferir de morte seu próximo, “com instrumento de ferro” (v. 16), “com pedra a mão” (v. 17), ou ainda “com instrumento de madeira” (v.17), ou por qualquer outra forma (vv.20,21), e a pessoa golpeada morrer, o autor da ação era considerado um homicida. Esse substantivo, rotseach, veio do verbo ratsach e aparece repetidas vezes. 

Homicídio culposo (Números 35:22 25). Era o crime involuntário e acidental, razão pela qual o autor não deveria morrer. A lei estabeleceu o procedimento a ser seguido para livrar o réu da pena de morte: ele precisava abrigar-se em uma das cidades de refúgio, ate provar que o homicídio fora acidental (Deuteronômio 19:4-6). Outra maneira de escapar das mãos do vingador do sangue era agarrar-se às pontas do altar (Êx 21:12-14; 1 Reis 1:50 51). Os dois recursos equivalem ao hábeas corpus concedido atualmente .

Vingador do sangue: Era um direito legal para que um homicida morresse, tão logo fosse encontrado. Isso poderia ser praticado por qualquer pessoa. A lei encontra-se em Números 35:19-21b, e o texto de Levíticos 19:21 acrescenta que, na aplicação da chamada “Lei de Talião”, não deveria haver piedade na aplicação, pois seguia o princípio da justa retribuição.

Matança em guerra: As guerras sempre foram o meio utilizado pelos povos, desde a Antiguidade, como forma de resolverem diferenças, ainda mais por expansão territorial e tirar vantagens econômicas. Aliás, não tem sido diferente em nossos dias. A batalha é fruto da ganância humana e pode ser considerada a maneira mais cruel e desumana de arrasar os povos inimigos. Faz-se necessário enxergar as guerras em Israel sob tal contexto, no qual seria praticamente inevitável. Por isso, o Senhor estabeleceu orientações gerais em Deuteronômio 20 Contudo, devemos levar em conta que a sobrevivência do povo de Deus dependia muito da vitória nas guerras, e é digno de nota que, embora elas acontecessem, em termos de crueldade para com os inimigos, Israel era bem mais “humano” do que os demais povos. E isso ocorria pelo fato de ter leis proibitivas quanto a abusos e a injustiças. 

 

NOVO TESTAMENTO: APLICAÇÃO DO SEXTO MANDAMENTO

Jesus não apenas manteve a ordem do sexto mandamento, mas ampliou e tornou-a ainda mais endurecida ao ressaltar que não apenas o homicídio consumado, mas até mesmo a intenção e o sentimento de ódio configuravam um crime pelo qual o homem teria culpabilidade diante de Deus (Mateus 5:21-22). Na carta de 1João, o escritor reafirmou tal verdade, mostrando que o sentimento de ódio alojado no coração é equivalante ao crime de assassinato (3:15). Encontramos paralelo em Caim, que matou (de forma premeditada e cruel) Abel, seu irmão, refletindo quem era em sua essência. Ou seja, seu coração era mau. Assim, o Novo Testamento tem mais rigor quanto ao sexto mandamento, não só preservando sua ordem original, mas também endurecendo e restringindo o assassinato.  

O apóstolo Paulo, por sua vez, vincula a prática do amor ao cumprimento do sexto mandamento, ressaltando que “...não matarás...” é essencial ao cumprimento do amor ao próximo e ao cumprimento da lei. O que se deve levar em conta é que tanto Paulo quanto João seguem o conceito de Jesus para homicídio, o que acontece no coração; e não somente os que são levados a fim.

 

CONTEXTUALIZANDO

Nos tempos atuais, não há muita resistência ao entendimento do sexto mandamento (mesmo que ainda haja confusão entre assassinato e outros crimes), pois a vida é o bem maior a ser protegido. Quanto a isso, praticamente também não há discordância; é uma verdade que inclusive nossa Constituição Brasileira, no Artigo 5º, assegura com “inviolabilidade do direito à vida”. 

No entanto, assuntos como pena de morte e homicídio praticado por forças de segurança ainda causam divisão de opinião entre os cristãos. O Novo Testamento não apresenta uma normativa bem definida sobre tais pontos. Embora Jesus e Paulo os tenham mencionado, eles não deixaram uma regulação explícita a essas práticas, tampouco as revogaram de forma direta. De fato, alguns textos sobre pena de morte aparecem, e nada é dito contra sua prática (cf. Mateus 26:52; Atos dos Apóstolos 25:11; Romanos 1:32; 1Pd 2:13-14). E, no Antigo Testamento (como já se mencionou), era uma norma bem clara, com prática frequente. 

Alguns segmentos do Cristianismo não têm problema em lidar positivamente com esses dois tipos destacados. Um exemplo é Solando Portela, que assim escreveu: 

 

A defesa da Pena de Morte, contra assassinatos [...] é uma atitude coerente com o horror à violência, demonstrado na Palavra de Deus. A Bíblia é contra a impunidade que reina em nossos dias, contra o desrespeito à vida. Esta violência, que é fruto do pecado e uma prova irrefutável da necessidade de regeneração do homem sem Deus, não pode ser combatida com a mesma violência da parte de indivíduos ou grupos, mas sim pelos governos constituídos. A Bíblia é, portanto, pela lei e pela ordem, pelo respeito à propriedade e à vida, pelo tratamento da violência dentro dos parâmetros legais do governo, pela Pena de Morte, para que a Sua Palavra seja respeitada, e a violência diminua na terra. 

 

Ainda quanto a esse respeito, Ezequias Soares comentou: 

 

Todos reconhecem que a pena de morte é uma lei que fere o espírito de perdão, amor e misericórdia, que formam a essência do Cristianismo; no entanto, ela está presente no Novo Testamento. A diferença do Antigo Testamento é que ali a lei prescreve como parte de um sistema legal e, aqui, não é mandamento, conselho ou incentivo. O Novo Testamento apenas reconhece que a pena capital existe. É como a bomba atômica: existe, mas não é para ser usada. Ela não vai resolver, como nunca resolveu, o problema da violência e da criminalidade, e serve para satisfazer caprichos de ditadores cruéis, muitos deles considerados fora da lei pela comunidade internacional. Em resumo, a pena de morte combate a violência com outra violência. A solução está na mensagem transformadora do Calvário. Jesus deu o exemplo ao absolver a mulher adúltera dessa sentença.” (João 8:1-11

 

Em outras palavras, a grande objeção à pena de morte é que a vida humana é tão preciosa e tão valiosa que nunca deveríamos levantar nossas mãos contra ela. Também todo ser humano é redimível. Por outro lado, a Bíblia diz que a vida humana é tão sagrada, tão preciosa, tão santa – a vida humana tem tanta dignidade – que, se com premeditação alguém destrói injustificadamente outro ser humano, essa pessoa, por isso mesmo, perde o seu direito à vida .

CONCLUSÃO

O sexto mandamento foi criado visando à preservação do direito à vida. O homem foi criado à imagem e semelhança de Deus; assim, atentar contra ele fere seu Criador. Embora a Bíblia mostre-se favorável à pena de morte em alguns casos, Jesus apontou a alternativa do perdão, da reconciliação e de “dar a outra face”, mostrando por ensinos e exemplos que um inimigo deve ser objeto de amor e de perdão. Que cada um possa honrar a Deus, dizendo não ao assassinato; e, sim, à vida. 

 

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